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Navegando pelos Rios da Amazônia


Mundo, vasto mundo!
Palavras que me vem à mente quando admiro a Amazônia. No entanto, não será sobre a maior floresta do planeta o meu relato, mas sobre uma viagem por um dos maiores rios que a cortam, o Rio Madeira, cujo nome se deve ao fato de trazer troncos de árvores que arranca de suas margens na época das cheias.


É um rio de águas barrentas por seu leito ainda está em formação, e com o fenômeno das "terras caídas", leva pedaços de barranco quando vai passando. Suas águas têm origem na Cordilheira dos Andes, passando pela Bolívia, entram no Brasil pelo estado de Rondônia e correm por mais de 3.000 km até encontrar o Rio Amazonas, sendo um dos seus maiores afluentes.


É de grande importância para o ribeirinho que dele tira o seu alimento, a água para consumo e em alguns lugares, o ouro. Além de ser a sua principal via de transporte, já que em quase toda a área por onde passa, é o único caminho que se tem de locomoção.


Mas essa não foi uma viagem de puro lazer, dessa vez o rio foi o caminho para o trabalho. Mesmo assim aproveitei para conhecer um pouco do dia a dia daqueles que vivem às margens do Madeira. E os primeiros que encontramos foram os garimpeiros, nas suas balsas flutuantes, em meio as águas do grande rio.


O objetivo da nossa viagem era o atendimento médico e odontológico numa das comunidades ribeirinhas que pertencem ao município de Humaitá, Carapanatuba. Não sei a quantos quilômetros ela dista, afinal a distância por ali não é medida dessa forma e sim pelos dias ou fração deles navegados.
Assim, gastamos nós uma tarde e parte da noite descendo o barrento rio até atracarmos no barranco que dá acesso à comunidade. Não sem antes sermos brindados com o belíssimo por do sol.


Do barco não saímos, pois a noite já se fazia alta, era hora de dormir. A equipe ficou acomodada em três camarotes e nos espaços onde foi possível amarrar redes.


Para mim a noite foi tranquila, nem mesmo vi por perto as famosas e sugadoras muriçocas, que por lá são conhecidas como carapanã. Aliás, nome bem parecido com o da comunidade anfitriã. Provavelmente foram afugentadas pelos "litros" de repelente e o providencial ar refrigerado do nosso micro camarote, onde só cabia um beliche e apenas uma pessoa entrava de cada vez, pulando logo para sua cama, permitindo que o segundo ocupante entrasse para se acomodar.


O dia amanheceu esplendoroso. Logo todos estavam de pé e prontos, após o café da manhã, para começar a organizar o equipamento e o ambiente de trabalho.


As duas equipes de odontologia ficaram nos consultórios montados no barco e, rapidamente, foram instalados o consultório para o atendimento clínico e o pediátrico em uma casa da comunidade, além do setor de triagem e orientação nutricional.
Aos poucos foram chegando os primeiros para serem consultados. Alguns de barco, outros a pé por meio das trilhas dentro da mata. Foi quando me dei conta do quanto de gente existe morando em meio a Floresta Amazônica.
Trabalhamos a manhã toda e paramos para o almoço. Por volta das 15 horas demos por encerrado o atendimento. Chegara a hora do retorno à cidade, não antes de embarcar de volta todo o equipamento utilizado nos atendimentos da população. Mas tudo foi muito rápido, afinal a equipe está preparada para o atendimento nas comunidades ribeirinhas.



Saímos no final da tarde, mas no Amazonas o sol demora a se por e  eu voltei a observar o que se passava às margens, enquanto deslizávamos pelo rio.

...O Rio, como a Floresta são as "prateleiras do mercado a céu aberto" de onde os ribeirinhos tiram seu alimento...


...O Rio é a estrada, e os barcos, os ônibus do povo que vive às margens de tantos rios da Amazônia...



... É do Rio que vem a água para o consumo doméstico, onde se toma banho e se lava a roupa da família...


No período de "seca" aparecem bancos de areia e se formam praias. Mas também é a época em que se necessita de perícia e conhecimento no comando das embarcações, evitando os locais onde o rio está mais raso e, consequentemente, mais propício para ocorrer encalhamento.



Vi o nosso comandante atento às manobras necessárias para evitar o encontro com os bancos de areia no meio do rio. Mas como agora iríamos contra a correnteza, o tempo gasto seria maior. Assim, para não navegarmos pela madrugada, atracamos próximo das 22 horas para o merecido descanso noturno, à beira de uma das diversas comunidades que existem ao longo dos rios amazonenses.
Às cinco horas da manhã os motores do barco já estavam ligados e retomamos a viagem, que durou a manhã toda, de retorno a Humaitá.



Aos poucos todos foram acordando para o café da manhã. Alguns nas cabines, outros em redes na parte externa do barco, curtindo a brisa amazonense.


Pelo rio, o vai e vem de balsas graneleiras escoando a produção de grãos do Centro-Oeste brasileiro e de Rondônia para Belém e de lá, para o comércio exterior. O Madeira é, atualmente, uma das mais importantes hidrovias do país.



E essas foram as últimas imagens dessa viagem de trabalho, mas também de muito aprendizado.

As típicas casas dos ribeirinhos




Humaitá.


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